Envelhecer com qualidade: direito da pessoa idosa e dever da sociedade

Por Nataly Leoni
Publicado em 03/10/2023

O envelhecimento é uma etapa natural na vida dos  seres humanos. Segundo dados da Organização Pan-Americana de Saúde – OPAS, a população está envelhecendo cada vez mais rápido, mas na América Latina e Caribe este processo é ainda mais acelerado. Em 2020, mais 8% da população possuía 65 anos ou mais, porém, a estimativa é que essa porcentagem dobre até 2050 e chegue a 30% até o final do século. No Brasil, de acordo com dados coletados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, em 2021 a porcentagem de pessoas idosas passou de  11,3% para 14,7% em um período de dez anos e até 2050 essa porcentagem pode chegar a 29%.

No entanto, para que a pessoa idosa consiga passar por essa etapa da vida de maneira confortável, segura e com seus direitos garantidos, a sociedade deve fornecer uma estrutura que possa acolhê-la, oferecendo condições para que essas pessoas possam ter qualidade de vida na velhice.

De acordo com a advogada previdenciária e presidente da comissão de direito previdenciário da Organização dos Advogados do Brasil – OAB, subseção de Vitória da Conquista – BA, Thays Gondim, a população como um todo deve ficar atenta aos direitos da pessoa idosa. “O advento da Lei nº 10.741/2003 trouxe consigo um dos maiores avanços da sociedade que foi o Estatuto do Idoso, a lei que está salvaguardando os direitos das pessoas acima dos 60 anos de idade. É importante que toda a população e não somente os idosos tenham conhecimento sobre esse estatuto, sobre os seus direitos de saber reivindicar, e as demais pessoas da sociedade para que respeitem e façam valer esses direitos onde quer que eles estejam”, afirma.

Thays Gondim, advogada

O Estatuto do Idoso dispõe de direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 anos. Entre os direitos previstos destacam-se: atendimento preferencial em estabelecimentos e instituições públicas, o direito a ter um acompanhante em tempo integral nos hospitais e o fornecimento de medicação gratuita, principalmente de uso contínuo. Além disso, as pessoas idosas têm direito a transporte público gratuito, a isenção ao pagamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana- IPTU, a pensão alimentícia, a tramitação prioritária de processos na justiça, a 5% de vagas de estacionamento, e meia entrada em eventos culturais.

A violação dos direitos

O estatuto da pessoa idosa prevê medidas para que elas possam ter seus direitos respeitados e uma série de benefícios, a fim de proporcionar qualidade nessa etapa da  vida. Contudo, é possível perceber que isso não é uma realidade para muitos idosos no Brasil. Conforme dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania – MDHC, foram registrados 202,3 mil casos de violação dos direitos da pessoa idosa nos três primeiros meses de 2023. Essa quantidade de registros se deve também à retomada do “Disque 100”, que atende a violação dos direitos dessas pessoas.

Segundo o MDHC, entre as formas de violência e abusos contra a pessoa idosa encontram-se: a negligência, sendo caracterizada pela falta de cuidados básicos, o abuso psicológico e as agressões verbais e físicas. Além disso, também caracteriza como violência qualquer forma de abuso que faça com que a pessoa se sinta humilhada ou fique isolada, o abuso financeiro, violência patrimonial, quando as pessoas se aproveitam do idoso para usufruir e controlar seus bens materiais e dinheiro, a violência sexual e institucional.    

De acordo com a pesquisa divulgada pelo MDHC, em mais de 87% das denúncias, as violações acontecem na casa em que a pessoa idosa e o agressor residem. Na maioria dos casos os responsáveis pelas violações são os próprios filhos, seguidos pelos vizinhos e netos desses idosos. Nos registros, a faixa etária que mais sofre com a violência é de 70 e 74 anos de idade, com 5,9 mil casos no início de 2022.

Por isso, é necessário atenção aos sinais de violação. “O idoso começa a se isolar, ficar calado demais, as vezes ele fica desconfortável na presença de algum familiar, ou de algum cuidador, é muito importante prestar atenção nesses sinais, ele começa a responder de uma forma muito diferente. Tem que prestar atenção se surgirem infecções, feridas de forma inexplicável nas áreas genitais, ou se ele está muito debilitado, desidratado, ou com mau cheiro, mesmo tendo um cuidador”, alerta Thays Gondim. 

Como combater as violações de direitos dos idosos? 

Em 2023, a Organização das Nações Unidas- ONU  dedicou o dia primeiro de outubro como o Dia Internacional do Idoso com o tema “Cumprindo as Promessas da Declaração Universal dos Direitos Humanos dos Idosos: Ao longo de Gerações”. A data visa, entre tantas outras atitudes, a luta pelo envelhecimento saudável. Para isso, é preciso a garantia dos direitos. Uma das maneiras de cumprir esses direitos é o combate a todo tipo de violência contra a pessoa idosa. 

As denúncias de abusos podem ser feitas por meio do Disque Direitos Humanos, o Disque 100, que funciona 24 horas por dia, inclusive nos finais de semana e feriados. O atendimento desse tipo de denúncia ocorre também pelo whatsapp, no número: 61-99656-5008, ou pelo próprio aplicativo dos Direitos Humanos Brasil. 

Thays Gondim afirma que o papel do advogado também é muito importante para a garantia dos direitos da pessoa idosa, para ajudá-la no acesso a benefícios e outros processos legais com mais segurança. “O advogado na vida do idoso é mais que necessário, mas é importante que se tenha contato com um advogado da sua confiança, sempre fazemos essa orientação. Que seja alguém que você já sabe a procedência como advogado. Eles podem também procurar a defensoria pública, porque é um serviço oferecido gratuitamente, ou procurar os núcleos de práticas jurídicas das faculdades”, explica.  

Vida ativa 

Muitas pessoas que passam a maior parte da vida trabalhando e realizando diversos tipos de atividades, quando chegam a uma faixa etária em que são consideradas como idosas, desejam continuar em atividade. Também é um direito da pessoa idosa continuar trabalhando, principalmente se for em algo que a faz bem. Zoraide Leoni de 82 anos faz bordados desde os sete anos de idade. Logo quando começou faze-los, ela começou também a vendê-los, enxergando uma possibilidade de renda utilizando algo que já gostava de fazer.     

Assim como com os bordados, Zoraide Leoni também passou a pintar em tecidos e telas. “Eu não tomei curso [De pintura em tecido], já em tela, eu fiz algumas aulas com Rominho, inclusive tenho telas pintadas aqui na minha casa. Eu faço porque gosto, até hoje ainda faço umas pinturinhas”, conta. Já na idade adulta, mesmo já tendo habilidades com diferentes tipos de bordados, ela também fez curso com uma professora  do Instituto Mauá, localizado em Salvador, para que pudesse ter uma certificação na área, o que ajudou a continuar vendendo seus trabalhos. 

Seu contato com a arte veio por meio da pintura, costura e artesanato que, além de fazer para fora, ainda trabalha em artigos para sua própria casa. Na maioria das datas comemorativas, Zoraide confecciona enfeites para a casa, além de se dedicar a construção de toda estrutura para o presépio no Natal, uma série de enfeites para as paredes e arranjos para as mesas.   

Zoraide afirma que continua vendendo os itens que ela mesma borda ou costura. “Ainda faço trabalhos para vender, apesar da idade, a gente fica fraca.” Por conta de problemas na visão e um acidente que a deixou com dificuldades de locomoção, ela diz que acaba sendo mais difícil, mas não deixa de trabalhar nos bordados. “O bordado é o meu forte, sempre bordei, e não vou deixar de bordar”, conta. Zoraide continua mantendo uma vida ativa, colocando o bordado que tanto gosta de fazer em toalhas, colchas de cama, panos de prato e outros produtos que são apreciados pelas pessoas.  Por meio de seu trabalho, durante a vida também desenvolveu grande empatia e respeito pelos idosos com que também já teve oportunidades de trabalhar e conviver.

Assim como Zoraide, Thays Gondim, também compartilha um carinho e admiração que possui pelas pessoas idosas. “Os idosos são o passado vivo, são a sabedoria em pessoa, são pessoas que acompanharam tantas transformações no mundo que guardam histórias incríveis e marcantes, que adoram contar sobre a experiência de vida. Como é bom sentar com esses idosos, ouvir suas histórias, ver como eles foram resilientes, mesmo com tantas mudanças seguem firmes felizes nos mostrando como a vida é boa. O nosso papel é protegê-los da maldade do homem, e da falta de conhecimento”, declara. 

Foto de capa: reprodução IBGE

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