Associação de moradores luta pela revitalização do entorno do Açude

Por Nataly Leoni
Publicado em 13/09/2023

O Açude é um dos mananciais que banham a cidade de Poções-BA e foi construído no Rio São José. Localizado no bairro Açude, o reservatório possui mais de 3 km de extensão e é um espaço de grande importância para a população que vive no bairro, próximo à margem e também para a população da cidade. 

No entanto, o reservatório vem sofrendo com a falta de cuidados e fiscalização ao longo dos anos e se tornou uma área utilizada para exploração, principalmente por obras de loteamento. Em um artigo científico intitulado “Expansão Urbana e Degradação Ambiental no Entorno do Rio São José em Poções, Bahia” de Manuela Santana e Valdelice Farias, publicado no livro Memórias Conquistense, as pesquisadores  abordam justamente o processo de urbanização em torno do Rio São José.

Atualmente, a Associação Açudense Social de Esportes e Cultura – AASEC vem trabalhando para mudar a realidade do local, solicitando informações às autoridades e buscando também ajudar na fiscalização e no uso do local para outras práticas.

Uma das mudanças que a AASEC vem implementando aconteceu no dia 13 de agosto deste ano, quando foi feito o 1º Torneio de Pesca de Poções. Realizado às margens do Açude, o torneio de pesca foi uma das maneiras que a Associação encontrou de mostrar à população que essa possibilidade existe. “Quando surgiu a ideia de promover o evento, foi que enxergamos a possibilidade real de transformar aquela área, pudemos ver os caiaques ali, as famílias reunidas em torno do rio naquele momento de confraternização. É um sonho antigo que a comunidade tem e que nunca tinha visto realmente acontecer. […] Em uma manhã conseguimos mostrar que de fato é possível”, afirma Graciela Sampaio, atual presidente da AASEC e moradora do bairro Açude.

O evento foi algo novo para os moradores e até mesmo para os idealizadores que contaram com o apoio de grupos de pescadores da cidade como Os Caiaqueiros e Pescadores Sem Fronteiras, grupos que viajam para competir em torneios e eventos de pesca em outras cidades. “Quando eles apresentaram para nós como funcionava e como eram as regras,  colocamos em prática e começou aquela movimentação, meu olho brilhou. Só de inscritos foram 63, e 24 pessoas vieram com caiaque. Superou todas as expectativas”, conta Graciela Sampaio. Além dos pescadores profissionais, o evento atraiu também amadores, pessoas que queriam fazer um passeio de barco e quem queria apenas assistir.

Na ocasião da realização do evento, os membros da AASEC apresentaram aos moradores um projeto de revitalização do local. 

O projeto

O desenho inicial do projeto foi desenvolvido por Graciela Sampaio em parceria com o diretor de segurança da Associação, Emerson da Silva Ramos. “Falei, vamos tentar desenhar alguma coisa aqui para dar cor e vida a essa ideia, e ficou bacana, o pessoal tem abraçado e achado interessante”, diz Graciela Sampaio. Durante o torneio de pesca, o esboço foi apresentado, e de acordo com Graciela, a lista de controle das pessoas que quiseram conhecer o projeto tem por volta de 240 assinaturas de moradores e participantes da competição. 

Esboço do projeto feito por Graciela Sampaio e Emerson Ramos

O projeto propõe diferentes atividades de lazer, áreas verdes e a possibilidade da prática de diversos esportes em sua extensão. “No entorno um corredor arborizado, quem sabe uns quiosques para fazer piquenique com a família… a nossa visão é essa, ter uma área de convivência para trazer esse olhar para aquela área, uma espécie de parque dentro da cidade” explica Graciela. A ideia é ter um espaço que possibilite o contato com a natureza com várias atividades, que seja organizado e possa se tornar um ponto de encontro para as pessoas da cidade. O desenho ainda é um esboço, porém Graciela Sampaio afirma que o projeto deve ser feito pensando em toda a parte de infraestrutura e questões florestais da área. “Não é só cobrar, mas mostrar o caminho, é isso que a associação tem empregado, trabalhar em parceria”, conta ela.

Avando da Silva Leite é conselheiro fiscal da associação de moradores e vive no bairro desde 1986. Para ele, com a revitalização, o Açude pode se tornar um ponto turístico. “Pode trazer melhorias não só para os moradores do bairro, como para atrair turistas e pessoas de outros lugares que possam vir curtir”, diz e completa mostrando admiração pelo lugar onde passou boa parte de sua vida. “Nosso Açude é um bem precioso, sou fã dele desde o dia que cheguei aqui.” 

Durante o ano de 2021 e 2022, com as chuvas que assolaram o Nordeste, o Açude atingiu seu nível máximo de capacidade e transbordou. Na ocasião,  os moradores do entorno, do Centro da cidade e de bairros que ficam nos arredores do curso do rio ficaram tensos com a possibilidade do rompimento da barragem.

 O técnico em eletrônica, secretário escolar e historiador por formação Elias Macieis, mora no bairro Açude desde que nasceu. Para ele, é preciso cuidar da segurança do Açude. “Porque volta e meia durante o período de enchente ele transborda e invade as casas do pessoal ali ao redor. Poderia ser feito uma coisa melhor ali para a água não invadir a casa do povo e até hoje nunca foi feito.”

Açude transbordando durante as chuvas Foto: Reprodução da internet

Elias Macieis concorda que o Açude é, e sempre foi, um ponto muito importante para os moradores do bairro. “Caso seja feita a revitalização, ali seria um ponto turístico interessante. Dava para fazer um monte de coisa (…) ele seria um ponto turístico, seria bom para o bairro e para a Cidade.”

Moradores como Avando da Silva e Graciela Sampaio estão buscando manter contato com a prefeitura. Mesmo assim, estão se mobilizando para dar início a esta revitalização. Graciela conta que a ideia é realizar mutirões de limpeza no entorno do rio para a retirada de pneus e outros materiais que são descartados no local. Os mutirões serão organizados pela associação, com participação das pessoas da comunidade.  “É o primeiro passo! Algo que nós, como cidadãos, podemos fazer e já chama atenção do poder público para outras atitudes”, diz Graciela.  

De acordo com Graciela Sampaio, a proposta do projeto foi entregue aos vereadores na sessão da Câmara do dia 21 de agosto e para a prefeita da cidade no dia 11 de agosto. Até o momento os moradores tiveram o retorno da vereadora Larissa Laranjeira-PCdoB que sinalizou a possibilidade de doação das mudas para o reflorestamento da mata ciliar do rio, mas eles ainda não podem aceitar sem o estudo prévio da delimitação de margens para saber o local adequado para o plantio.

Lei da pesca predatória 

Atualmente os moradores do bairro Açude estão reivindicando cumprimento da Lei n° 1.246/2019 que “dispõe sobre a proibição da pesca predatória na Barragem de Morrinhos e no Açude do Rio São José”. A lei impede que ocorra a pesca ilegal no Açude, e de acordo com os moradores, seu cumprimento e fiscalização efetiva da área seria um pontapé para a revitalização do espaço. “Até mesmo para o ano que vem nós podemos trabalhar a questão do segundo torneio. Vamos precisar que essa lei esteja de fato funcionando, porque queremos ampliar o torneio não só para as pessoas do município, mas também para pescadores de fora, para mostrar a beleza que temos aqui”, diz Graciela Sampaio.  

De acordo com o presidente da Câmara Municipal de Vereadores, José Mauro, a Câmara aprova os projetos, mas a fiscalização fica por conta do poder executivo. Por isso, por parte da câmara, não há um acompanhamento do cumprimento da lei da pesca predatória na área do Açude.   

Com a realização do 1º Torneio de Pesca, os moradores se mostraram esperançosos em conseguir trazer outros eventos aquáticos inéditos para o município como uma competição de canoagem. “O rio tem uma certa extensão, então a gente pode fazer esse tipo de brincadeira, mas claro para chegar nesse nível precisamos do poder público junto para transformar a área”, afirma Graciela Sampaio. Segundo ela, por mais que sonhem em ver acontecer esta revitalização, reconhecem que é um projeto difícil de ser colocado em prática, e que talvez seja necessário não só o apoio municipal, mas também estadual.    

A transformação da área é um sonho dos moradores, mas pode beneficiar o município como um todo. Graciela Sampaio entende que além do incentivo à prática esportiva e turismo, a revitalização pode movimentar a economia da área. “Se tem pessoas circulando, vai ter alguém vendendo o seu lanche. E nós podemos viabilizar esses pontos comerciais trabalhando da maneira correta, porque vai estar numa área de preservação ambiental então tem que ter todo o cuidado”.  

Os moradores concordam que o Açude é um local que traz muitos benefícios para a população, por isso necessita de cuidados, fiscalização e investimento.  “O Açude traz benefício para nosso bairro, para nossa cidade, para a população e até para as pessoas que vêm de fora”, afirma o morador Avando da Silva. Assim como o rio oferece recursos essenciais, também pode oferecer oportunidades de lazer, recreação e melhoria na qualidade de vida para a comunidade local e para toda a população do município. 

O Site Coreto buscou saber junto a Secretaria de Infraestrutura, órgão da prefeitura municipal responsável, sobre possíveis melhorias na infraestrutura do Açude, a viabilidade da implementação do projeto, mas até o momento da publicação desta matéria, não obtivemos retorno.   
A nossa equipe também fez contato com vereadores citados pelos entrevistados e que estiveram presentes na reunião da Câmara no dia 21 de agosto. O vereador Diogo Chulu- PSD respondeu que o projeto é viável, mas será preciso um estudo técnico para analisar as leis vigentes no município, inclusive o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano-PDDU. Dos demais contactados não tivemos resposta.

Foto de capa: Danilo Mileno

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