Comemorações de São João movimentam empreendimentos liderados por mulheres

Segundo dados do relatório, realizado em 2023 pelo Sebrae, as empreendedoras mulheres hoje somam mais de 10 milhões de donas de negócio
Por Daniela Palmeira
Publicado em 21/06/2024

O mês de junho, desde os primeiros dias, traz as expectativas dos festejos juninos: nas playlists o ritmo predominante é o forró; nas feiras e mercados as comidas típicas são destaque nas vitrines; as bandeirolas coloridas deixam ruas, casas e estabelecimentos com mais vida e tornam esses espaços mais bonitos. Além disso, as comemorações antecipadas reafirmam a cada dia o clima de São João, um lembrete constante de que o mês de junho carrega uma tradição que marca gerações. Em Poções, cada um desses detalhes movimentam a economia da cidade de diferentes formas. 

A costureira Daiane Heisig empreende na profissão há cerca de 12 anos e conta que no decorrer dos meses o seu negócio passa por altos e baixos, mas devido ao São João, junho é garantia de muitos pedidos e novos clientes. “Eu posso afirmar que o mês de junho é um dos melhores meses do ano. Eu venho trabalhando, geralmente todos os anos de dois, três meses antes, no intuito do São João”. Ela costura de tudo um pouco quando chega o período junino, desde figurinos para quadrilhas juninas até vestidos e roupas típicas para crianças e adultos.

Nesse ano Daiane Heisig recebeu uma quantidade de pedidos que superou suas expectativas, pois a procura teve um aumento significativo em comparação ao mesmo período do ano passado. De abril a junho, os pedidos se acumulam e exigem da costureira mais disciplina que o habitual para dar conta de todos os trabalhos com cuidado e destreza. “Muitas vezes tem que estender horário, não dá para trabalhar no horário comercial, horário certinho. Tem que levantar mais cedo, tem que trabalhar até mais tarde para dar conta de todo o serviço”, explica. Para Daiane, ainda que este seja um período extremamente agitado, é igualmente gratificante perceber como o seu trabalho está sendo procurado e reconhecido. 

Entre linhas, agulhas e máquinas de costura, Alvaneide Ferreira compartilha do sentimento de Daiane Heisig. Costureira há 10 anos e proprietária do Ateliê Sonho de Mãe, Alvaneide Ferreira se surpreendeu com a demanda de trabalhos para o período de São João neste ano. “Temos uma demanda boa durante o ano inteiro, porque trabalhamos muito com fardamentos, mas meio de ano e final de ano é que aumenta mais. Esse ano, então, foi uma demanda bem razoável, eu sinceramente não esperava”. Alveneide estima que o aumento de pedidos chegou a aproximadamente 70% em relação à demanda em outros meses do ano, sendo necessário, inclusive, recusar alguns pedidos. 

Alvaneide Ferreira Foto: arquivo pessoal

Junho também é um mês movimentado para o ramo alimentício, principalmente para os alimentos produzidos especialmente para essa temporada, como os licores. Sheila Cunha é estudante do curso de Farmácia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia e através das atividades práticas de uma disciplina ofertada na graduação percebeu que a produção de licores poderia ser uma oportunidade de fazer uma renda extra e ainda empregar o conhecimento acadêmico. 

“No oitavo semestre eu tenho uma disciplina que chama Tecnologia de Alimento, que estudamos quais são as tecnologias aplicadas no ramo industrial, voltadas para a produção alimentícia, e aí dentre uma das suas práticas que tivemos foi a prática de licor, de licor artesanal”, explica Sheila. Foi como se uma lâmpada acendesse em cima da cabeça da estudante, como nos desenhos animados, a ideia parecia perfeita e Sheila não perdeu tempo, apostou suas fichas. “Eu queria que fosse algo bonito, assim, dedicado, fosse feito com zelo, porque quando você também passa a imagem para o cliente de uma imagem feita com zelo, é mais fácil para se vender”, conta.

Sheila pensou em cada detalhe da produção. O primeiro passo foi criar uma marca para o licor, não queria nada óbvio, mas algo que trouxesse o clima das festas juninas e convidasse os clientes a experimentarem, e assim chegou ao nome “Fogueira de Sabor”. Ela mesma desenvolveu o rótulo, com a marca do produto, sabor e demais informações e, em seguida, fez a impressão em sua casa. 

Outro ponto fundamental para Sheila foi decidir em qual tipo de garrafa o licor seria vendido. Nessa escolha, o que mais pesou foi a relação de custo-benefício e também logísticas de transporte do produto, o que levou Sheila a escolher garrafas de plástico. Por fim, Sheila decidiu os sabores: café, doce de leite, amendoim e chocolate. “E aí eu comecei a divulgar, eu fiz no Instagram, mandei para conhecidos e tentei divulgar”. Aos poucos os clientes chegaram e com eles o retorno positivo sobre o seu trabalho, o que a deixou com a sensação de dever cumprido. 

A produção de licores também foi uma alternativa de renda para Jamile Pacheco. Em 2020 ela se viu desempregada, sem renda fixa, quando seu primo incentivou Jamile a começar a produzir licores para vender durante o mês de junho. “Na época ele tinha uma loja de embalagens e me sugeriu que fizesse que ele colocaria lá para venda”, lembra. Além disso, naquele ano, a pandemia obrigava que as comemorações fossem fechadas, apenas entre a família, cada um em sua casa. Algo que levou Jamile a pensar que, apesar do momento, as pessoas gostariam provavelmente de consumir o tradicional licor de São João.

Com o apoio e estímulo do primo, e sua força de vontade, Jamile deu início a produção e em 2024 completa cinco anos comercializando seu produto durante as festas juninas. Quando o mês de junho bate à porta, ela sabe que já está na hora de escolher os sabores e preparar as encomendas dos seus clientes fieis. “A cada ano que passa meu produto acaba ficando mais conhecido, o boca a boca de um indicar para o outro e por aí vai. Às vezes não dou conta da demanda porque trabalho em outro local”.

O empreendedorismo feminino como um caminho de independência e liberdade financeira

Segundo dados do Relatório Técnico de Empreendedorismo Feminino, realizado no quarto trimestre de 2023 pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), as empreendedoras mulheres somam, atualmente, mais de 10 milhões de donas de negócio, o que representa 33,9% do total de proprietários de negócios no país. O levantamento apresenta também dados sobre a distribuição dessas mulheres por regiões, o Nordeste é a segunda região com maior presença de donas de negócio, com 23%, atrás somente do Sudeste, com 44,4%.

O relatório do Sebrae mostra ainda que a participação de mulheres como empreendedoras vem sendo construída de forma discreta, mas consistente ao longo dos anos. “Se no último trimestre de 2012 a participação era 31,4%, no último trimestre de 2023 chega a um aumento de 2,5 pontos percentuais”, relata o documento. A alternativa de empreender no mercado de trabalho é uma opção para muitas mulheres que querem trabalhar em algo que se identificam e que, principalmente, possa lhe garantir renda e/ou estabilidade para seguir sonhos e projetos.

Apesar de ser costureira há uma década, o ateliê de Alvaneide só passou a ser realidade há três anos. Hoje, mesmo com as dificuldades de administrar uma empresa, é com orgulho que diz que trabalha para si mesma. Tudo fica ainda mais especial, pela costura ser algo que sempre fez parte da sua vida. Desde de criança Alvaneide fazia roupas para suas bonecas, quando cresceu continuou costurando e buscou se profissionalizar no ofício, lutou até conseguir realizar o sonho de ter o seu espaço e a sua independência, como costureira e como mulher. “Eu sinto prazer pela arte da costura, amo o que faço e faço com amor, não me vejo fazendo outra coisa”.

Daiane Heisig também tem o próprio ateliê que fica em sua casa, construído aos poucos, conforme ganhava popularidade com a profissão. Quando começou a ganhar seu próprio dinheiro, Daiane passou a investir no negócio. “Eu comecei a investir em máquinas, comecei a comprar máquinas de costura de qualidade, que facilitassem o meu trabalho, máquinas industriais. Com isso, com esse conhecimento e essa grande procura pelo meu trabalho, eu comecei a crescer”, revela. 

A procura crescente pelo seu trabalho e reconhecimento dos clientes foi algo inesperado quando começou a trabalhar com a costura, mas que a encheu de alegria, coragem e inspiração para ter um ateliê para chamar de seu. “Montei o meu ateliê na minha casa e hoje eu tenho quatro máquinas industriais que atendem a minha necessidade de acordo com a demanda que eu tenho de trabalho”.

Ainda que os negócios de Sheila Cunha e Jamile Pacheco não sejam fixos, mas de temporadas, a determinação em empreender nessa época rendeu a cada uma delas a experiência de administrar o próprio negócio e deixar sua marca na lembrança dos clientes. Por isso, mesmo tendo um emprego fixo em uma empresa privada, Jamile continua a vender os licores no São João, pois além de lhe render um dinheiro extra, já conquistou um público que anualmente faz questão de consumir o seu produto.

Para Sheila Cunha, a experiência de empreender nessa época é algo novo, mas, desde já, bem-vinda. A estudante conta que tem uma rotina extremamente atarefada, entre faculdade, estágio, cuidados domésticos, além da produção dos licores. No entanto, por morar em outra cidade, todo o dinheiro é bem-vindo para ajudar nas despesas e a manter os estudos e demais projetos pessoais.

“Quando você mora fora, você tem vários gastos e eu tenho alguns gastos pessoais, então é justamente ali na perspectiva de tentar lhe ajudar de alguma forma a suprir seus gastos mensais, porque são muitas contas. É justamente nessa perspectiva que vai ajudar realmente, porque eu tenho projetos, de faculdade para realizar, então acaba que auxilia nesse aspecto”.

Foto de Capa: Alvaneide Ferreira em seu ateliê- Arquivo pessoal

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