“Eu acredito na mudança da educação através da leitura”, conta a professora da rede municipal de ensino de Poções, Alcimone Marinho. Atualmente, a educadora desenvolve um projeto de estímulo à leitura na Unidade Escolar Municipal Conveniada Dr. Antônio Carlos Magalhães (UEMCACM) e no Instituto Educacional Professora Bohêmia Marinho (IEPBM). O projeto surgiu a partir de dois sentimentos do coração de Alcimone Marinho: o amor pela literatura e o desejo de apresentar aos seus alunos o mundo por meio dos livros.
A professora conta que já passou por situações complexas ao longo de sua vida, e durante esses momentos em que se sentia perdida e sem saber o que fazer, os livros foram companheiros fiéis e refúgio para se distanciar do sofrimento. “Comecei a ver que aquilo estava salvando minha vida”. Em vista disso, os livros ocupam um lugar especial em sua vida, e na sua trajetória como professora de língua portuguesa não poderia ser diferente. A sala de aula sempre foi um espaço onde a literatura se fez presente, pois Alcimone Marinho procurava formas de fazer com que o ato de ler se tornasse algo prazeroso.
Entretanto, após dois anos lutando contra um câncer de mama, por indicação médica, a professora precisou ser afastada das atividades em sala de aula. Em um primeiro momento, o afastamento deixou Alcimone Marinho triste, pois se viu impedida de realizar seu trabalho e não conseguia se imaginar longe do ensino e dos seus alunos. Ela queria e precisava continuar na escola. Nesse momento, a solução encontrada pela direção da UEMCACM, foi a de deixar a professora como responsável pela sala de leitura da escola.
Entre leitura e diversão: como o projeto acontece
“Quando eu vi os livros eu fiquei apaixonada, e comecei a fazer um trabalho com os alunos, de ir na sala, de fazer propaganda, de chamar os alunos e também do reforço escolar”. Alcimone Marinho queria dar vida à sala de leitura da escola, e para isso precisava cativar os alunos, a fim de que, cada vez mais, eles começassem a frequentar o local. Algum tempo depois, entre idas e vindas, a professora retornou para a sala de aula e precisou deixar de lado a sala de leitura. Durante o período em que ficou fora, o espaço ficou cerca de quatro anos desativado.
No início deste ano, Alcimone Marinho retomou seu projeto de estimular os alunos a ler. Novamente responsável pela sala de leitura da escola, a professora desenvolveu seus próprios métodos para conquistar os alunos, despertando a curiosidade sobre as histórias que poderiam conhecer. Para cumprir esse objetivo, o WhatsApp é uma ferramenta fundamental, pois cada turma participa de grupos de informativos sobre a escola. São nesses grupos que Alcimone Marinho divulga a chegada de novos livros com fotos, comentários e curiosidades sobre as obras disponíveis na escola. Além disso, a professora também passa de sala em sala para falar sobre os livros.
A partir desse contato e do surpreendente retorno que ele gerou, a professora passou a conhecer melhor o que despertava o interesse dos alunos. Por isso, apesar de receber doações, Alcimone Marinho resolveu investir por conta própria em exemplares que contavam com muita procura entre os estudantes, mas que não eram disponibilizados pelo governo. “O resultado é que eu tenho filas de espera”, mostra a professora com o caderno de empréstimo de livros em mãos. Poder adquirir esses livros e ver os alunos motivados a ler, é o que recompensa Alcimone Marinho.
“Para mim foi uma surpresa, porque eu fiz uma conta do primeiro semestre, do quanto eles tinham lido, e eles leram mais de 2.700 livros”, revela a professora. Como consequência a sala de leitura não fica vazia, principalmente durante o recreio. A professora gosta de dar atenção a cada aluno, conversar sobre os livros lidos e sobre aqueles que ainda serão descobertos, e acredita que isso é algo importante para motivar os jovens leitores. Alcimone Marinho se orgulha das folhas preenchidas no seu caderno, em que consta o nome de cada aluno, respectiva turma e livro que pegou emprestado.
A professora já fez premiações para os alunos que mais leram, inclusive espera realizar novamente a distribuição de alguns prêmios em parceria com a Secretaria de Educação. Contudo, o próximo passo que já está ansiosa para colocar em prática é o de fazer uma “biblioteca itinerante” durante as férias, para que os alunos não fiquem sem ler. “Eu já tenho uma lista de alunos que nas férias eu vou entregar o livro em casa”. A ideia inicial é levar até os alunos, livros da escola que eles tenham interesse em ler. “Eu tenho uma biz e vou nessa biz levar os livros, para não deixá-los sem ler”.
Os alunos e o projeto
Segundo a quinta edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada em 2019 pelo Instituto Pró-Livro (IPL), Itaú Cultural e IBOPE Inteligência, o professor está entre as principais pessoas que mais influenciou o gosto de leitura dos entrevistados. Além disso, a pesquisa mostra ainda que, entre os fatores que influenciam na escolha de um livro, as dicas de professores estão entre as cinco respostas mais influentes.
O resultado dessa influência pode ser visto entre os alunos do UEMCACM que estão em contato com o projeto de Alcimone Marinho. Como é o caso de Misael Souza, 14 anos, que sempre frequenta a sala de leitura. No ano anterior, apesar de fazer visitas ao local, Misael Souza não tinha o hábito de ler livros, algo que só se tornou recorrente este ano. As indicações de Alcimone Marinho despertaram a curiosidade do aluno para conhecer os livros. Hoje ele já descobriu seus gêneros preferidos, gosta de ler terror e suspense.
Erica Silva, 12 anos, e Ana Luiza Novais, 15 anos, já gostavam de ler, mas o projeto da professora apresentou a elas um espaço onde poderiam compartilhar o amor pelos livros. “Acaba virando um grupo pra nós conversarmos sobre livros (…), nós podemos discutir a história, o que nós achamos”, conta Ana Luiza Novais. Além disso, por meio do projeto os alunos entendem a importância e o impacto da leitura em suas vidas. Erica Silva gosta da forma como os livros estimulam sua imaginação e como possibilitam que ela conheça outras realidades. “Parece que eu entro em um mundo totalmente novo, que só existe em minha cabeça, eu fico imaginando os personagens como seriam. (…) É incrível, quando você começa você se apaixona”.
Karolaine Nascimento, 12 anos, e Davi Silva, 11 anos, também já tinham o costume de ler, pois eram estimulados pelos pais, mas o projeto da professora foi algo que intensificou o ritmo de leitura dos alunos. Entre os dois, a conversa é sobre quem lê mais livros, Davi Silva conta que só no primeiro semestre já leu 80 livros, enquanto Karolaine Nascimento já leu uma média de 150. Mesmo assim, os alunos não estão satisfeitos com os números, ainda esperam viver incontáveis vidas e conhecer outros mundos.
Para a produção dessa reportagem, a equipe do Site Coreto buscou, junto a Secretaria Municipal de Educação, saber se existem projetos semelhantes ou quaisquer outros projetos de leituras em outras escolas do município. No entanto, até a publicação da matéria não obtivemos retorno do setor.