Quem passa pela rua Olímpio Rolim, no centro de Poções, vê uma construção histórica que carrega em sua arquitetura a marca de tantas histórias. A Filarmônica 26 de Junho é uma sede cultural da cidade, com mais de um século de existência foi palco para muitos nomes, histórias e projetos, abrigando escola de música, produções teatrais e eventos artísticos.
O espaço surgiu com o nome Sociedade da União das Classes de Poções e servia como local de ensaios da própria Filarmônica Primavera, que era grupo musical que participava de desfiles e eventos festivos, utilizando a sonoridade dos instrumentos de sopro e percussão. Posteriormente passou a ser chamada de Sociedade Lítero Musical Primavera. Nos anos 1980, o local ganhou novo impulso com a Casa da Cultura, que se dedicava à promoção de eventos artísticos e culturais na região. Na época, a gestão foi assumida pelo poeta José Onildo Fagundes Marques, que trouxe um professor de música para revitalizar a tradição da filarmônica, reacendendo o interesse da comunidade pela arte e educação musical.
Em Junho de 2005, o espaço passa a ser chamado oficialmente de Associação Cultural Filarmônica 26 de Junho que passou a olhar para o legado histórico do espaço e propor renovação. “Desde então, a instituição ampliou sua atuação, organizando eventos culturais, festivais de teatro, saraus literários e feiras de arte, além de fortalecer a Escola de Música. Hoje, a Filarmônica 26 de Junho se consolida como um polo de difusão cultural e educacional, integrando tradição, formação artística e engajamento comunitário.” afirma o maestro Antônio Leandro Fagundes Sarno

Antônio Leandro Fagundes Sarno é servidor público municipal desde 1999. Advogado, músico e compositor, desde outubro de 2007, atua como professor e maestro regente da Filarmônica 26 de Junho, dedicando-se à formação musical de jovens e à preservação do patrimônio cultural local.
Sua trajetória na música começa muito cedo, ganhando destaque na banda “Alfa Centauros”, fundada por Sandoval Lago, Pitoco e Francisco Schettini – nomes que Leandro aponta como referências da musicalidade regional. Leandro também passou pelos grupos “Face Nova” de Vitória da Conquista, e “Iluminados”, que acompanhava os espetáculos do Padre Valmir Neves.
Leandro compartilha que essa influência da filarmônica em sua vida nasceu de histórias compartilhadas por seu avô, Antonio Fagundes, pelos seus tios Zelinho e Quito Fagundes e por amigos. “Seus ensinamentos e exemplos de vida moldaram minha percepção da música e seu papel transformador na comunidade,” conta.



Qual a importância do espaço para a cultura poçoense?
O palco da Filarmônica 26 de Junho é cenário de momentos que marcam a história de Poções. “Nesse ambiente rico em tradição, mantemos uma escola de música que oferece aulas de canto coral, teclado e prática filarmônica, com uma metodologia inspirada no modelo histórico das bandas de música.” afirma Leandro.
Atualmente a Associação Cultural Filarmônica 26 de Junho é gestora da escola de música e da banda da filarmônica. Os projetos visam a integração da educação e da arte, valorização e preservação do patrimônio local. Além disso, o espaço também busca ser um lugar de resgate e perpetuação do legado histórico da Sociedade Lítero Musical Primavera, fundada em 7 de setembro de 1911, cuja existência deixou marcas permanentes na identidade cultural poçoense.
“Essa abordagem garante a preservação da sonoridade tradicional que ecoa há mais de um século em nossa região. Ao unir educação musical, fortalecimento da identidade comunitária e resgate da memória histórica, a associação assegura que o patrimônio cultural local seja transmitido às novas gerações, mantendo viva a essência artística e social que define nossa cidade”, pontua Leandro.
Relação com o poder público
A entidade mantém as atividades no espaço com a parceria com o poder público municipal. De acordo com o maestro, a parceria fortalece a tradição musical local e a formação de novas gerações de músicos, consolidando a filarmônica como um símbolo vivo da identidade cultural da região. “Nos últimos anos, expandimos essa parceria por meio da Secretaria Municipal de Educação, instituindo o Projeto Primavera, que integra estudantes da rede pública municipal ao ensino de canto coral, teclado e instrumentos filarmônicos. A iniciativa promove educação inclusiva e democratiza o acesso à arte, com o pleno apoio institucional do município, garantindo qualidade tanto na Escola de Música quanto no novo programa.”, comenta o professor de música.
Em 2015, foi implementada a Lei Municipal Nº 1104/2015 que destina recursos mensais à Associação. Tais recursos são aplicados na manutenção do espaço com despesas fixas como água e energia, material pedagógico, instrumentos e outros custos operacionais.
100 anos em páginas
Por sua ligação e conhecimento da história da Filarmônica, Antônio Leandro Fagundes Sarno, que também é pesquisador, está desenvolvendo um projeto de escrita de um livro, onde visa homenagear e registrar o legado da entidade cultural, para que as próximas gerações tenham acesso. Segundo o maestro, foram anos de pesquisa para montar um acervo com registros fotográficos, documentos históricos e depoimentos de pessoas que conviveram diretamente com integrantes que passaram pela história do órgão. “Ao explorar essas memórias e arquivos, tornei-me plenamente consciente da urgência de preservar esse legado. A filarmônica não é apenas uma entidade artística: é um reflexo vivo da identidade coletiva da nossa cidade e da memória de seu povo”, comenta o músico.
A urgência em fomentar a cultura poçoense
O acesso à cultura é um direito de todo brasileiro, garantido pelo artigo 215 da Constituição. Além de uma experiência artística, a cultura também é uma necessidade do ser humano. Por isso, propõe ser a ponte entre o cidadão e a cultura, ele pode contribuir para o fortalecimento do espírito coletivo, do diálogo comunitário e estimular o desenvolvimento de conhecimentos.
“É fundamental que estudantes e a população em geral tenham acesso facilitado a oportunidades culturais. Promover a participação comunitária em atividades artísticas é investir na educação integral e na construção de uma sociedade mais justa, vibrante e solidária,” afirma Leandro.
Ao longo da história da Filarmônica, muitos artistas colaboraram para a sua manutenção e para a perpetuação de sua história. Para o maestro, ainda que seja difícil resgatar a trajetória de todos os músicos e membros da diretoria que contribuíram com a filarmônica. Ele lembra de alguns nomes que, segundo ele, merecem destaque pela dedicação e legado deixado.
Antonio da Silva Fagundes – começou a trajetória musical na Lítero Primavera em 1920 como caixista e, dois anos depois, assumiu a tuba em Mi bemol por mais de seis décadas (1922–1988).
Mestre Nadinho – regente da Lítero Primavera desde os 17 anos (1917). Compositor e líder, conduziu a banda por quase 60 anos, até seu falecimento em 1974.
Antonio Faca Doida – trombonista, servidor público e alfaiate, destacava-se pela versatilidade e compromisso com a Lítero Primavera. Na década de 1980, assumiu a presidência da instituição, e seu legado na instituição continua por meio do trabalho de seus filhos na Filarmônica 26 de Junho: Tassinho (trompetista), Dalma (diretora) e Manoel Alex (tesoureiro).
Heráclito Fagundes (Quito) – trompetista e contador de profissão, era conhecido pela disciplina e excelência artística. Seu filho, Welinton Fagundes, é o atual presidente da Filarmônica 26 de Junho.
Gisélio Fagundes (Zelinho Fagundes) – servidor público e filho do Mestre Nadinho, foi um entusiasta do jazz e dos discos de vinil.
Zoma – servidor público e músico, integrou a Lítero Primavera e foi um dos fundadores da Filarmônica 26 de Junho.
Gildenor Andrade – clarinetista e saxofonista, integrou a Lítero Primavera nas décadas de 1960–1970. Quando passou a residir em Salvador, retornava anualmente a Poções para participar da Festa do Divino.
Pia Soldado – trompetista e servidor público, fez parte das formações clássicas da Lítero Primavera nas décadas de 1960–1970 e contribuiu para a fundação da Filarmônica 26 de Junho.
Alcides Bordado – alfaiate e músico da Lítero Primavera, transmitiu seu amor pela arte ao seu filho Valdemi, que organiza uma banda com músicos de Salvador para a Festa do Divino.
Emanuel Campos de Sá – conhecido com Seu Nelito, foi fundador e presidente da Filarmônica 26 de Junho (2007–2013).
Tonhe Luz – foi da Lítero Primavera e cofundador da Filarmônica 26 de Junho.
Welinton Fagundes – atual presidente da Filarmônica 26 de Junho. Sua gestão é responsável pela estrutura organizacional que hoje permite à instituição oferecer educação musical.