Combate à LGBTfobia: a importância de ações pela diversidade sexual

Por Leila Costa
Publicado em 17/05/2023

O dia 17 de de maio é declarado o Dia Internacional de Combate à LGBTfobia. A data é simbólica e um marco contra o preconceito, pois foi em 17 de maio de 1990 que a Organização Mundial de Saúde – OMS retirou o termo “homossexualismo” da lista de distúrbios mentais do Código Internacional de Doenças- CID. A partir de então, a terminologia usada passou a ser homossexualidade.

Durante este mês, ações e campanhas destacam a importância do respeito às diversidades sexuais e do combate ao preconceito. Em Poções, nesta quarta-feira (17/05), acontece o lançamento da 1ª Campanha Municipal de Enfrentamento à LGBTfobia.

O lançamento será na Câmara Municipal de Vereadores, a partir das 18h. Com o tema “Diálogos sobre uma sociedade diversa – Pela liberdade de Ser, Viver e Amar”, o evento conta com a presença da Dra. Luciana Silva, doutora pela PUC-SP, professora do curso de Direito e coordenadora da Clínica de Direitos Humanos da Universidade da Estadual do Sudoeste da Bahia e presidenta da OAB- Subseção de Vitória da Conquista e do professor, ator, palestrante e apresentador, Adão Albuquerque.

A campanha é parte do acordo firmado entre a Prefeitura Municipal e o Ministério Público estadual após o caso de transfobia envolvendo um adolescente do município e é realizada por meio das secretarias de Assistência Social, Saúde e Educação e conta com a parceria do Conselho Municipal de Diversidade Sexual e de Gênero, o mandato da vereadora Larissa Laranjeira, a ONG Mães da Resistência e o coletivo Nós da Diversidade.

Para Juarez Oliveira, integrante do Coletivo Nós da Diversidade que vem, ao longo de sua existência, atuando no combate a preconceitos, visando a garantia de direitos para a população LGBTQIA+ e levando conhecimentos à população, maio é um mês de reflexão, de mostrar a relevância da militância e de demonstrar para a população jovem a importância de defender as bandeiras e fazer parte dessa militância na busca por direitos. 

“Agora sentimos a necessidade de estar mais próximo dos órgãos públicos, porque nós sabemos como alguns setores ainda sentem dificuldades em lidar com a chamada diversidade, aí agilizamos essas parcerias para organizar esses eventos, voltados para a formação e garantias de inclusão e direitos para a população”, conta Juarez Oliveira.

Foto: Reprodução PMP

O caso de transfobia e as ações do município

Em 2022, a cidade de Poções foi marcada por um episódio de transfobia. Um adolescente foi vítima do preconceito após manifestações de religiosos contra um Projeto de Lei municipal que visava assegurar o reconhecimento do nome social.

O projeto, de autoria da vereadora Larissa Laranjeira (PCdoB), foi encaminhado à câmara de vereador após Janaina Brito, mãe de um adolescente trans, ter relatado sobre os obstáculos que seu filho encontrou para adoção do nome social na escola em que estudava. Apesar de já ter leis no âmbito federal e estadual que asseguram esse direito, o projeto de Lei n° 21/2022 foi rejeitado por sete votos a quatro, em votação ocorrida no mês de junho de 2022.

Juarez Oliveira destaca que essa situação mostrou o conservadorismo e a homofobia presente na sociedade poçoense. No entanto, ele reconhece que apesar desse episódio de transfobia e outros episódios de homofobia que o coletivo enfrentou por parte de religiosos da cidade, o coletivo, juntamente com a população LGBTQIA+ tem conquistado alguns avanços e ocupado espaços no município. Um desses avanços  foi nas eleições de 2020, quando quatro  candidatos ao legislativo da cidade eram componentes do Nós da Diversidade. “Poções foi destaque a nível nacional por ter quatro candidatos LGBTQIA+ e por conseguirmos eleger a primeira mulher lésbica à câmara de vereadores”

Após esse fato, o Ministério Público estadual firmou um Termo de Ajustamento de Conduta- TAC com o município de Poções visando a garantia do respeito e dignidade do ser e à diversidade sexual. Entre os termos acordados, estão que o município deve estabelecer normas para o atendimento adequado e qualificado às pessoas LGBTQIA+; também promover capacitação e aperfeiçoamento dos servidores ou prestadores de serviços, sobre identidade de gênero, o direito ao uso do nome social e o reconhecimento da LGBTfobia como crime. Além disso, a gestão ficou incubida de produzir e distribuir cards e folders digitais e físicos, contendo informações para a toda a comunidade referente aos direitos das pessoas LGBTQIA+, em especial aos transgêneros e travestis, e realizar pelo menos uma palestra sobre o tema para o corpo discente e docente de cada uma das escolas municipais.

O coordenador técnico-pedagógico de Educação em Direitos Humanos e presidente do Conselho Municipal de Diversidade Sexual e de Gênero, Danillo Bittencourt, disse que as ações do poder público municipal começaram desde o início da gestão, quando foi instituído o Conselho Municipal de Diversidade Sexual e de Gênero de Poções, ligado a Secretária de Assistência Social, e também a Coordenação de Direitos Humanos, locado na Secretaria de Educação. 

“Outro ponto também são as ações do Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS e do Centro de Referência Especializado de Assistência Social- CAMVI, no atendimento da população LGBTQIA+ vítima de violência. O serviço do CREAS tem atendido às vítimas de  LGBTfobia e o CAMVI, que hoje faz um serviço de atendimento às mulheres vítimas de violência, e que tem um olhar interseccional para as mulheres trans e travestis, no atendimento”, diz o coordenador  .

Segundo Bittencourt, neste ano de 2023 também foi instituído no município, que todas as unidades escolares tenham um projeto que objetive trabalhar, durante o ano, uma educação para a equidade. Além disso, outro projeto será implementado a partir do mês de junho nas escolas municipais. “Fizemos um convênio com a Clínica da Uesb e iremos caminhar nas unidades escolares para conversar com os alunos do sétimo e oitavo ano, essa parte da adolescência de 14 a 16 anos que estão nessa perspectiva de mudança do corpo e, muitas vezes, sofrem com piadinhas na sala de aula, vamos fazer esse convênio para lidar com essas questões”, informa. 

Sobre os termos acordados no TAC, com o Ministério Público, Bittencourt informa ainda que a portaria de matrícula foi criada prevendo que as pessoas trans com 18 anos ou mais possam fazer esse requerimento para a escola e adotar o nome social nas plataformas, caderneta, provas e diploma. Já para os alunos menores de 18 anos, o processo também é feito, mas precisa da autorização dos pais.

A campanha que terá início hoje, será digital, mas o coordenador garante que também será transformada em banners e folders que serão distribuídos posteriormente em postos de saúde e nas unidades escolares do município. “Eu sempre falo, eu acredito que o TAC foi um pontapé para nós começarmos a observar outras questões no município, pois, às vezes, nós, no dia a dia da administração pública e na correria dos papéis, esquecemos de olhar o humano, de olhar a pessoa, então eu acho que o TAC  fez essa reviravolta de termos essa preocupação humana de observar outras questões”, diz. 

A atuação de Janaina Santos

Após o ocorrido com o seu filho, Janaina Brito ingressou na luta por direitos da população trans. Atualmente ela é vice-coordenadora da Ong Mães da Resistência e atua em prol dos direitos dos filhos trans. O coletivo é atualmente um representante no Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+,  no biênio 2023-2025.

“Hoje eu acolho muitas pessoas LGBTs aqui no município, tanto em acompanhar na matrícula escolar, dar suporte às mães para melhor compreender as necessidades dos filhos, também levo em hospitais. Pois sei que é um processo, às vezes lento, dos pais compreender, me deparo com mães em crise de ansiedade e acabo ajudando elas também”, explica Janaína Brito.

Além disso, Janaina Brito atua realizando palestras em órgãos públicos municipais e até de outras cidades. Apesar de todos os acordos do TAC ainda não terem sido cumpridos, Janaina Brito acredita que muitas mudanças importantes já aconteceram. “Este mês, que a luta contra o preconceito tem um holofote maior, é necessário refletir que essa luta é diária, que o amor e o respeito possam prevalecer, pois isso salva vidas. Essa campanha de Poções contra a LGBTfobia me trás esperança de dias melhores”, 

Violências contra LGBTQIA+ no Brasil 

No Brasil, desde junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal- STF definiu a favor da criminalização da homofobia. De acordo com a lei 7.716/1989, mesma lei para crimes de racismo, quem ofender ou discriminar pessoas LGBTQIA+  está sujeito a punição que pode ser de um até três anos de prisão,  reconhecendo  o preconceito contra como crime de racismo,sendo um crime inafiançável e imprescritível.

Mesmo com a homofobia sendo considerado crime, o Brasil é apontado como o país que mais mata pessoas LGBTQI+, entre todo os países do mundo, como aponta o “Dossiê de Mortes e Violências contra LGBTI+ no Brasil”, publicado pelo Observatório do Grupo Gay da Bahia e produzido por meio do Observatório de Mortes e Violências contra LGBTs.

O dossiê aponta que no ano de 2022, 273 pessoas LGBTQIP+ foram mortas de maneira violenta no país. Desse número 228 foram vítimas de assassinatos, 30 de suicidio e 15 de outras causas. Além disso, o documento destaca que do número de mortos 159 eram mulheres trans e 97 eram gays. O nordeste é a região com o maior número de mortes, com 118, em seguida vem o sudeste, com 71 mortes.

Em 2023, o dossiê aponta, de acordo com dados parciais, que entre janeiro e abril já foram 80 mortes. A população de travestis e mulheres trans, representa 62,50% do total dessas mortes, com 50 mortes; os gays representaram 32,50% dos casos, com 26 mortes; homens trans, 2,50% dos casos com 2 mortes; mulheres lésbicas correspondem a 2,50% com 2 mortes. Não foram registrados casos contra pessoas bissexuais.

Esses dados mostram que, apesar de alguns avanços, ainda é necessário a realização de ações que visem a garantia de serviços públicos  visando os direitos dessa população.

Foto de Capa: Pixabay

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