POÇÕES| Vereadores vetam Projeto de Lei que assegura o uso do nome social no âmbito municipal

Vereadores de Poções rejeitam por sete votos contra e quatro votos a favor o Projeto de Lei n° 21/2022 que determina o uso do nome social
Por Leila Costa
Publicado em 14/06/2022

Na segunda-feira (13/06), a Câmara Municipal de Vereadores de Poções rejeitou por sete votos contra e quatro votos a favor o Projeto de Lei n° 21/2022 que determina o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas transexuais no campo da administração pública municipal e principalmente nos registros das escolas.

O projeto é de autoria da vereadora Larissa Laranjeira (PCdoB) e entrou em pauta após os relatos de Janaina Brito sobre os obstáculos para adoção do nome social de seu filho, um aloescente trans, na escola em que estuda e a falta de uma regulamentação municipal que garanta esse direito em outros ambientes. A PL já havia sido retirada de pauta em outras duas sessões e ganhou visibilidade após áudios de um  pastor ser divulgado em redes sociais.

Mesmo já existindo resoluções estaduais e federais que garantem o uso do nome social, sete vereadores votaram contra o projeto. Os vereadores Eduardo do Sindicato (PSB), Gê de Gircelio (PTB), Joilson da Eletrônica (AVANTE), Lande da Caçamba (PTB), Maria Ziza Rocha de Souza (PL), Neto de Dodô (REPUBLICANOS) e Zilduardo de Almeida (PTB) votaram contra, quatro deles, fazendo uso do nome social de parlamentar. Os vereadores Luana de Maria do Fato (AVANTE), Larissa  Laranjeira (PCdoB), Professor  Vivaldo Júnior (PCdoB) e Diogo Chulu (PSD), votaram a favor. O vereador Leordino de Oliveira (PSB) faltou a sessão por problemas de saúde e o vereador José Mauro é o atual presidente da Câmara.

Para o professor João Paulo Vilarim, a não aprovação do projeto foi um momento de tristeza para a comunidade LGBTQIA+. “Infelizmente não foi aprovado pelos vereadores retrógrados que nós temos e pensando dessa forma é que precisamos afirmar que existe uma Lei Estadual e uma Lei Federal que nos assegura, que podemos está acima desta questão. Acho que é importante nós estarmos mais unidos do que nunca para lutarmos a favor dos nossos direitos e em prol da humanidade e não podemos nos aceitar nesse espaço que nos colocam, de subalternidade,” conta.

Na reportagem publicada pelo Site Coreto no dia 03 de junho, relatamos a luta da microempreendedora Janaina Brito para a adoção do nome social do seu filho trans pela escola onde estuda e expomos a transfobia que ela e sua família sofreram. O caso repercutiu e foi destaque em outros veículos digitais e de TV de nível estadual e nacional.

Desde a divulgação dos relatos das agressões, órgãos, coletivos e instituições vêm ajudando e tomando as medidas cabíveis para que os direitos do adolescente sejam respeitados. 

A Associação Nacional de Trans e Travestis (ANTRA) está acompanhando o caso e, por meio de nota divulgada no dia 8 de junho, informou que autoridades já foram acionadas para cuidar do caso. “Diversos grupos estão acompanhando o caso, assim como prestando apoio à família e lutando pela garantia do direito à educação com o respeito aos direitos previstos no estatuto da criança e do adolescente, assim como para identificar as violações dos direitos dessa família e possíveis ações de reparação,” informa a nota divulgada no Instagram oficial da ANTRA.

A Ordem dos Advogados do Brasil Subseção de Vitória da Conquista, também tem acompanhado o caso e se colocou à disposição da família. No dia 7 de junho a entidade entregou um parecer técnico,  pela aprovação do Projeto de Lei que regulamenta o nome social, ao presidente da Câmara Municipal de Vereadores, José Mauro. 

“Reafirmamos a legitimidade e a necessidade de regulamentação da matéria por meio da legislação municipal, ao tempo em que prestamos nossa solidariedade para todos, todas e todes indivíduos da comunidade LGBTQIA+ que têm enfrentado imenso desrespeito operado contra à sua autoidentificação no Município de Poções, rechaçando, ainda, qualquer prática de violência física, verbal ou psicológica em razão da orientação sexual e identidade de gênero,” determina o parecer.

RESPOSTAS

Após a repercussão do caso, partes envolvidas no fato se pronunciaram. A Secretária Municipal de Educação (SEMEP), através do Coordenador Técnico-Pedagógico de Educação em Direitos Humanos, Danillo Bittencourt, informou que não houve uma negativa por parte da SEMEP quanto ao uso do nome social. Por meio de nota enviada para a nossa equipe, o coordenador informou que a escola já adotou o nome social do adolescente na plataforma e na caderneta, e que a escola já  fez uma reunião com os professores para informar sobre a mudança a respeito da identificação do adolescente.

Leia a nota na íntegra.

A primeira procura da genitora do adolescente ocorreu no dia 18 de abril de 2022, onde sinalizou à diretora da unidade escolar a transição de gênero de seu filho. Neste momento, a diretora encaminhou a genitora a rede socioassistencial da Prefeitura de Poções para atendimento jurídico e psicossocial, uma vez que era uma situação até então não ocorrida na unidade escolar. Neste atendimento, a rede informou que algumas demandas não estavam sob a competência dos serviços mobilizados e encaminhou a genitora à Secretaria Municipal de Educação.

No dia 26 de abril de 2022, a Coordenação de Educação em Direitos Humanos atendeu a genitora em companhia com o adolescente. Ela relatou sobre a ida à escola e sobre os atendimentos realizados pela rede socioassistencial. Informou que estava em contato com algumas organizações da sociedade civil e apresentou várias minutas e resoluções sobre o nome social. Informamos sobre a autonomia do nosso Sistema Municipal de Ensino e sinalizamos duas ações, naquele momento: 1. Solicitação da inserção do nome social na Plataforma Digital E na Caderneta Escolar, com respeito ao recomendado pela resolução do Conselho Estadual de Educação da Bahia e 2. Encaminhamento ao CME das resoluções de nome social para estudo e possibilidade de criação de uma normativa própria em nossa rede de ensino. As ações foram realizadas de forma autônoma, uma vez que a inserção do nome social já é garantido pelas resoluções dos Conselhos Estadual e Nacional de Educação. A proposição de uma normativa própria é para construir uma ação educativa na rede municipal de ensino para casos futuros referentes a essa demanda. 

A partir do dia 29 de abril, a unidade escolar nos informou sobre a mudança do nome na Plataforma e na Caderneta. Sinalizou, também, que se reuniu com os docentes para informar sobre a mudança e a atitude de respeito à identificação do adolescente. 

No dia 05 de maio, a psicóloga que acompanha a família procurou a escola e informou que, num dos atendimentos realizados, o adolescente sinalizou o constrangimento sobre o uso do banheiro: não sentia mais vontade de utilizar o banheiro feminino e também tinha constrangimento de usar o banheiro masculino. A diretora, prontamente, ofereceu nesse momento os banheiros dos funcionários até pensar em novas estratégias. 

Em 06 de maio, a direção da escola convocou a rede socioassistencial para apresentar os casos de violação de direitos existentes em sua unidade escolar e, na ocasião, apresentou essa demanda referente ao uso do banheiro. Sinalizamos a ativação de um banheiro que existia na escola, compramos os materiais necessários para efetivar essa ativação e criamos o banheiro dos estudantes, um espaço a ser utilizado por qualquer estudante que não desejar usar os banheiros coletivos masculinos e femininos. 

Nessa reunião, outra ação agendada foi a realização de uma roda de conversa sobre as temáticas de direitos humanos com toda unidade escolar e, também, sinalizar esse novo momento da escola com a presença de um adolescente em processo de transgeneridade.  Este encontro não ocorreu porque o município teve uma paralisação dos contratos dos docentes e, logo após, as festividades do Padroeiro da cidade. A direção sinalizou uma nova agenda para as próximas semanas. 

Ademais, no dia 01 de junho, em reunião de pais, para apresentação do fechamento da I unidade, a genitora publicamente agradeceu ao atendimento da escola às necessidades de seu filho e relatou a felicidade do mesmo com as mudanças estruturais que têm ocorrido na unidade escolar. 

Esses foram os contatos e encaminhamentos ofertados pela Secretaria Municipal de Educação. Desde o primeiro atendimento até as modificações do registro e da infraestrutura da escola, a unidade escolar e a Secretaria de Educação atuaram para promover os direitos humanos e a cidadania do adolescente, o que torna inverídicas algumas notícias veiculadas na mídia local, estadual e nacional.  

Atenciosamente,

Danillo Bittencourt

Coordenador Técnico-Pedagógico

Educação em Direitos Humanos

Já o Pastor Luciano Novais, optou por se manifestar via nota divulgada na página oficial da PIB (Primeira Igreja Batista) em que dizem não ser homofóbicos. “Jamais consentiríamos com a falta do devido respeito a todas as pessoas, independentemente de suas escolhas sexuais e de gênero”.

A nota ainda diz que lamentam a repercussão da convocação para mobilização contra o projeto, feita pelo pastor por meio de áudio. “Contudo ressaltamos que associar a convocação do pastor com os supostos ataques transfóbicos e relacionar tais crimes imputando-os aos evangélicos, não passa de pura especulação”, acrescentam. “O áudio do pr. Luciano de Jesus Novais fez referência ao projeto apresentado como uma ‘aberração’ por ser algo ruim que deve ser inibido e acompanhado pois entendemos que se baseia em resoluções que foram tomadas buscando resolver casos concretos, mas, sem considerar o interesse público, o bem comum e ainda desconsidera os argumentos contrários ao uso do nome social nas escolas e traz implicações ‘desastrosas’ para a educação”, diz a nota.

Relacionados

Pular para o conteúdo