Reclamações, ações no MP e pedido de cancelamento marcam trajetória do Concurso Público de Poções

O Concurso público da cidade de Poções teve o edital 01/2022 divulgado após ação do Ministério Público do Estado da Bahia, que determinou a suspensão dos editais 01/2022, 02/2022 e 03/2022 responsáveis pelos processos seletivos simplificados para a contratação temporária de funcionários. O concurso ficou marcado por questionamentos, atrasos, inúmeras reclamações de candidatos a respeito de falhas na organização, representação da Ordem dos Advogados do Brasil, subseção de Vitória da Conquista, alegando violação de artigos da constituição federal e ainda a ação do MP pedido o cancelamento na Justiça e no Tribunal de Contas dos Municípios (TCM). 

Sobre o concurso

O edital 01/2022 com as disposições para a realização do concurso foi lançado em 26 de agosto de 2022, sob a responsabilidade do Instituto Brasileiro Educar Conquista -IBEC. O instituto foi contratado diretamente pela prefeitura municipal com dispensa de licitação, pelo valor de 7 mil reais, de acordo com o edital. 

A contratação sem licitação gerou questionamentos, inclusive na Câmara Municipal de Vereadores. Na sessão realizada no dia 29 de agosto de 2022, disponível na Internet, o vereador Diogo Chulu informa ter feito uma indicação junto a prefeita pedindo a anulação ou suspensão do contrato com a banca IBEC, ele ainda questiona o número de vagas disponibilizadas. Na indicação o vereador pede que a contratação da banca organizadora do concurso seja contratada por meio de ampla licitação. A prefeitura seguiu com a dispensa de licitação e contrato com o Instituto IBEC.

Processo de licitação

A licitação é o processo em que a Administração Pública contrata serviços, obras ou compras e vendas. De acordo com o Portal da Transparência, a licitação é importante, pois assegura a seleção de propostas adequadas, possibilita tratamento de igualdade entre os licitantes e uma competição justa. Além de evitar contratações com sobrepreço e superfaturamento na efetivação dos contratos.

Hoje em dia, duas leis gerais de licitações estão em vigor, a Lei nº 8.666/1993, válida até o mês de março de 2023, e a Lei nº 14.133/2021 a Nova de Lei de Licitações e Contratos. Até março de 2023, o gestor público pode optar por utilizar as regras de qualquer uma das duas leis, no entanto, não pode combiná-las em uma mesma competição.

A atuação da banca IBEC

O edital de inscrição foi divulgado no dia 26 de agosto e, logo após a sua publicação, alguns pontos já foram motivos de questionamentos da população como o valor da taxa de inscrição, com valores de R$ 60,00 para nível fundamental, R$ 90,00 para nível médio e R$ 150,00 para nível superior; o número de vagas que foi bem abaixo das disponibilizadas nos editais da seletiva e o prazo para solicitação da taxa de isenção de apenas dois dias, 27 e 28 de agosto, um fim de semana.

De acordo com o edital de inscrição, as provas do concurso, para todos os níveis, seriam realizadas no dia 16 de outubro de 2022. No entanto, o mesmo edital previa que “caso a cidade de Poções não suporte a capacidade de inscritos no Concurso Público ao final das inscrições, frisamos que as provas poderão ser aplicadas em datas e turnos diferentes, sendo publicado um novo Cronograma de Atividades.” No edital 02/2022 da convocação para a realização da prova objetiva, divulgado no dia 11 de outubro, seis dias antes da data prevista para a realização das provas, o instituto disponibilizou um novo cronograma para a aplicação das provas.

A aplicação das provas foi dividida em dois dias e três turnos, matutino e vespertino no dia 16 e matutino no dia 23 de outubro. No dia 16, foram aplicadas as provas para os cargos de nível superior e nível fundamental. Já as provas para os cargos de nível médio e técnico, a aplicação da prova aconteceu no dia 23, mesmo dia de aplicação da prova do Concurso 01/2022 da EMBASA- Empresa Baiana de Águas e Saneamento, cuja a data prevista para a aplicação da prova já havia sido divulgada no dia 01 de outubro.

Essa mudança no cronograma de aplicação das provas e o choque de horário com a prova da Embasa gerou prejuízos para candidatos que estavam inscritos nos dois concursos e, consequentemente, tiveram que escolher apenas um para fazer as provas. O economista, de formação, Alessandro Brito foi um dos candidatos prejudicados com a mudança no cronograma do Concurso da Prefeitura. Com as provas em horários simultâneos, ele teve que escolher qual prova fazer. “Quando vi que a IBEC havia publicado o edital de convocação de provas e o aviso de que dividiria em duas datas o concurso, por cargos e candidatos, foi frustrante. Isso porque estudar para um concurso demanda tempo e sacrifício, além disso, diante do momento em que o país vem passando, tirar qualquer valor de sua receita, faz falta”, conta.

Alessandro Brito diz que com a publicação do edital de realização das provas, por parte da banca, ele analisou qual era a melhor opção para o momento e para isso levou em consideração critérios como segurança e credibilidade de ambas as bancas. “Uma vez que já tinha tido o desgosto de me inscrever para o concurso de Bom Jesus Serra em 2020 com a mesma banca (IBEC) e não houve prova e nem a devolução do valor da inscrição, até os dias atuais, logo, decidi pelo da Embasa, não somente pela questão de ser um concurso estadual, mas principalmente pela credibilidade e segurança do Instituto AOCP, acabou não sendo difícil a escolha. O que foi chato é saber que fui eliminado do concurso da Prefeitura Municipal de Poções sem ao menos ter feito a prova e nem ter tido a opção de escolha. Isso porque lá no período da inscrição não havia possibilidade de escolher datas e não imaginávamos que teria dois dias de provas”.

Uma candidata ao cargo de digitadora, que não quis se identificar, disse  que foi uma escolha difícil decidir qual prova fazer. “Eu vinha estudando para as duas provas, seria uma possibilidade a mais de ser aprovada em um concurso. Optei por fazer a do município porque não era necessário se deslocar para outra cidade. Mas fica a pergunta: e se eu tivesse feito? poderia ter feito uma boa prova? Quando você está estudando para concurso fazer provas é parte do processo, conhecer as dinâmicas das bancas e superar suas próprias metas, esse era o meu objetivo. A frustração e a pressão psicológica para  escolher um ou outro foi, o que podemos considerar, danos morais”, diz. 

O Instituto Brasileiro Educar Conquista justifica a mudança no cronograma, com duas datas, ao fato de a cidade não ter suportado o número de inscritos. Contudo, em uma análise no edital com os locais de provas, é possível identificar que algumas escolas da cidade não foram usadas para a aplicação de prova. 

Os dias de aplicação das provas também  foram de transtornos e reclamações para candidatos. Para a auxiliar de escritório Iasmim Luz, que concorreu ao cargo de Contadora, o concurso foi bem organizado e gerou desconfortos aos candidatos. “No dia da prova, os participantes não tiveram direito a um saco para guardar seus objetos pessoais, não foi transparente, a banca postou erratas um dia anterior a realização da prova”. A auxiliar de escritório também se queixa da falta de transparência nos resultados. “Foram resultados confusos, solicitei o recurso de uma questão que foi deferida, porém, o gabarito pós recurso não havia sido modificado”, conta Iasmim Luz. 

Já o professor Matheus Godeiro, questionou, além do fato de ter pagado um valor de 150 reais na inscrição para nível superior e não ter tido direito a uma sacola porta objetos para guardar os pertences pessoais, os atrasos no primeiro dia de aplicação da prova. “Me senti prejudicado com o horário para começar a prova, visto que não tinha carteira para todo mundo e não tinha prova para todo mundo, então isso gerou um desconforto geral na sala, porque só iniciariamos a prova se todos estivessem sentados devidamente na sua sala, porém nós tivemos um atraso de uma hora”.

Além disso, o Instituto atrasou o cronograma de divulgação dos gabaritos parciais e dos gabaritos oficiais das provas.  A respeito do atraso na divulgação dos resultados, a banca informou em nota divulgada em sua página oficial que “o atraso na publicação foi ocasionado em virtude do oferecimento de recursos administrativos por parte de alguns candidatos após a divulgação do Gabarito Oficial, o que gerou uma reanálise dos recursos interpostos relacionados a prova objetiva e, posteriormente, publicação de um Gabarito Oficial – Retificado, este que fora publicado no dia 16 de novembro de 2022”, diz a nota.  

A ação da OAB

Em 18 de novembro de 2022, a Ordem dos Advogados do Brasil – subseção de Vitória da Conquista entrou com uma representação ao ministério público comunicando que o Concurso Municipal de Poções havia violado o artigo 132 e 29 da Constituição Federal. Isso, porque no edital que rege o concurso dispunha de quatro vagas para o cargo de Procurador Jurídico e segundo o artigo 132 da Constituição Federal “o ingresso na carreira do Ministério Público far-se-á mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em sua realização, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e observando-se, nas nomeações, a ordem de classificação”.

Segundo a presidente da OAB-subseção de Vitória da Conquista, Dra. Luciana Silva, a participação da instituição não foi efetiva na organização do concurso, o que vai contra as determinações da Constituição Federal. “Isso é um problema,  porque a OAB precisa participar desde o início da elaboração do edital. A participação da OAB é ativa, não é simplesmente chegar e falar, nós estamos fazendo um concurso e a OAB tem que participar”, diz.

Em nota, divulgada em sua página oficial na internet, o instituto IBEC informa que “ não compete a Instituição enviar informações para o respectivo acompanhamento do órgão, sendo de sua responsabilidade, após a indicação do representante, buscar e acompanhar todas as informações necessárias com a respectiva Comissão Especial de Fiscalização e Acompanhamento do Concurso Público” e ainda acrescenta que a OAB  não buscou informações com a banca nem com a Prefeitura Municipal de Poções, por meio da Comissão do concurso, sobre como estava o andamento do Concurso.

Dra. Luciana Silva salienta que quando a OAB foi informada da existência do concurso ele já estava em andamento. “Quando ficamos sabendo do concurso, através de ofício, ele já estava caminhando, nós fizemos um ofício indicando uma advogada para que ela fosse nomeada como membro da comissão, mas essa nomeação jamais aconteceu. A participação não é a OAB que tem que procurar, e o ente realizador do concurso que deve passar essas informações de como a prova vai ser, colocar uma pessoa, nomear na comissão, então não é uma participação meramente de informar para OAB que o concurso está existindo, nós tínhamos que estar atuando na comissão, em todas as fases do concurso e isso efetivamente não aconteceu”.

Ação do Ministério Público 

Ontem, 05 de dezembro, o MP, por meio do promotor de justiça da cidade de Poções, Ruano Leite, moveu uma ação na justiça e também uma representação ao Tribunal de Contas dos Municípios -TCM contra o Município de Poções e a banca organizadora, IBEC, pedindo a suspensão do edital 01/2022 do concurso público alegando irregularidades na contratação que resultou em danos para o patrimônio público. Dentre as irregularidades apontadas pelo promotor estão algumas já citadas e motivos de queixas de candidatos como “vícios na dispensa de licitação, apropriação ilegal pelo instituto das receitas auferidas com as inscrições e diversas irregularidades na execução das provas”.

De acordo com o MP, na ação o promotor de justiça pede a anulação do concurso e solicita o resarssimento dos danos, a condenação ao pagamento de danos morais coletivos, a aplicação das sanções previstas na lei anticorrupção e ainda a realização de novo concurso público no município. 

Durante todo o processo de produção dessa reportagem, a nossa equipe buscou esclarecimentos junto ao Poder Público Municipal, à Comissão organizadora do concurso e ao Instituto Brasileiro Educar Conquista, a respeito dos questionamentos dos participantes e das ações junto ao MP.  

Contactamos o senhor Joavan Emidio, por meio do WhatsApp e ligações, em dias diferentes, mas não tivemos retorno.  O contato com a Comissão foi feito com a presidente, a advogada Aline Curvêlo, que a princípio não atendeu às nossas ligações e ainda nos bloqueou em duas contas diferentes de WhatsApp sem nos dar nenhum retorno. Hoje a advogada atendeu a nossa ligação e informou que não iria dar entrevista e que, a princípio, não tem nada para falar sobre o Concurso Público Municipal. O IBEC também não respondeu nosso e-mail.

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